 Não importa sol ou sombra
Não importa sol ou sombra camarotes ou barreiras 
toureamos ombro a ombro as feras. 
Ninguém nos leva ao engano 
toureamos mano a mano 
só nos podem causar dano as esperas. 
Entram guizos chocas e capotes 
e mantilhas pretas 
entram espadas chifres e derrotes 
e alguns poetas 
entram bravos cravos e dichotes 
porque tudo o mais são tretas. 
Entram vacas depois dos forcados que não pegam nada. 
Soam brados e olés dos nabos que não pagam nada 
e só ficam os peões de brega
cuja profissão não pega. 
Com bandarilhas de esperança 
afugentamos a fera estamos na praça da Primavera. 
Nós vamos pegar o mundo 
pelos cornos da desgraça 
e fazermos da tristeza graça. 
Entram velhas doidas e turistas 
entram excursões 
entram benefícios e cronistas 
entram aldrabões 
entram marialvas e coristas 
entram galifões de crista. 
Entram cavaleiros à garupa 
do seu heroísmo 
entra aquela música maluca 
do passodoblismo 
entra a aficionada e a caduca mais o snobismo 
e cismo... 
Entram empresários moralistas entram frustrações 
entram antiquários e fadistas 
e contradições 
e entra muito dólar muita gente que dá lucro aos milhões. 
E diz o inteligente que acabaram as canções. 
Fernando Tordo, 1973
A propósito das comemorações do 25 de Abril, e relembrando os cantautores de intervenção que marcaram uma época, relembro este poema como uma pérola da língua portuguesa, fruto de um dos nossos mais geniais poetas: José Carlos Ary dos Santos. Também absolutamente brilhante a música criada pelo Fernando Tordo! Um verdadeiro tesouro!
 
